Le Chevalier Mal Fet

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Feliz daquele que,
Em regozijo, abraça o par
Que a alma lhe completa e dá vida
E desagua-se em comunhão absoluta
Como a onda se entrega ao mar.

Mas, Destino traiçoeiro,
Dizei-me, como hei de sê-lo,
Se de teus ardis fui vítima desonrada
E, na penumbra da noite dolorosa,
Fizeste-me agir sem prudente zelo?

De minha corte, de minha felicidade
Fui cruelmente desposado
Clamo em meu exílio "Guinevère, Guinevère"
E responde-me o destino com silêncio lancinante
Prelúdio da morte de um amor amaldiçoado.

Prantos amplificados pelo desespero
Seguiram-se aos inconscientes caprichos do pecado
As notas da angustiante melodia entoada
Pelo sofrimento perene e sempre-renovado
Hão de lograr-me imperiosamente a companhia
Em meus desolados e intermináveis dias
De cavaleiro renegado.

Vale dos Homens

domingo, 17 de junho de 2012

Esculpido em ônix permaneço
Impermanentemente o mesmo.
Ao desejo de voar substitui-se
O medo de eternamente rastejar
No perecível vale dos homens.

À morte de meu ego declaro
Guerra, mas pereço assim mesmo,
Sem nunca os pés tirar
Dessa vil e miserável terra.

Pois que tenho em mente
Senão desejos profanos?

E nesta manhã de outono
Vejo-me pendendo com as folhas
E levanto e caio
E levanto e caio,

Inutilmente alimentando
Esperanças de um além-tempo,
Além-ego, além-verso,
Além-mim-mesmo. Mas,

Esculpido em ônix permaneço
Impermanentemente o mesmo.
Ao sonho de voar substitui-se
A certeza de eternamente rastejar
No perecível vale dos homens.

Pois que tenho em mente
Senão desejos profanos?

Necromante

domingo, 4 de março de 2012

Onde antes habitou uma ferida
Apresenta-se uma fera morta e renascida
Respirando as cinzas do castelo que ardera
Engasgada com os álgidos cacos do sentimento
Que ao longo dos séculos foi seu único alento
Mas agora jaz meio caída, moribunda
Com o necromante a aguardar de soslaio
No sopé de uma torre que foge do céu
Escondendo-se numa depressão profunda
Negra, consumida pelo fogo de outrora
Em contraste sombrio com as cores vivas da aurora
Revelando pecado, vaidade e indolência
Mas a fera sobrevive com veemência
Respirando as cinzas do castelo que ardera
Engasgada com os álgidos cacos do sentimento
Que ao longo dos séculos foi seu único alento
Ao lado das lágrimas que pendiam pelo amor que perdera.

Duas Dezenas e Um Janeiro

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O tempo de hoje adormeceu
Com o fantasma do amanhã pairando no ar
Com os ventos cruéis que sopram do mar
Trazendo o frio que congela minha garganta
E a ponta da foice que não me permite gritar
Não me permite cantar, não me permite correr
Não me permite morrer, não me permite matar
Apenas contemplar aquilo que um dia foi festa
E que, hoje, nada disso resta
Com o fantasma do amanhã ainda pairando no ar
Oferecendo-me desolação, solidão, vinho barato
E nenhum lugar para ficar.